A
Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Intermédica
Sistema de Saúde S. A. a pagar indenização de R$ 10 mil a uma
trabalhadora que sofreu discriminações por desenvolver obesidade
mórbida. Seguindo o voto do relator, ministro Maurício Godinho Delgado,
no sentido de que o tratamento dispensado pela empresa desrespeitou os
princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, do valor social
do trabalho e da isonomia de tratamento, a Turma restabeleceu sentença
da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo, apenas readequando o valor
inicialmente arbitrado.
A
supervisora, admitida pela Intermédica como recepcionista em 1989,
trabalhou por quase 20 anos, até ser dispensada em 2008. Segundo contou
na reclamação trabalhista, nos últimos anos do contrato, devido a
problemas hormonais decorrentes de tratamentos de fertilidade, seu peso
aumentou acima do normal – e, por isso, passou a ter problemas também no
ambiente de trabalho. Seu superior imediato, "por diversas vezes e de
forma irônica", dizia que ela precisava emagrecer porque o padrão da
empresa era "de mulheres loiras de olhos claros, cabelos lisos e
magras", pois os clientes preferiam ser atendidos "por uma mulher
bonita, e não por uma pessoa largada".
As
cobranças acabaram gerando estresse, constrangimento e depressão. Com o
diagnóstico de obesidade mórbida, os médicos da empresa disseram que a
solução do problema não era clínica, mas cirúrgica, mas o plano de saúde
da empregada não cobria esse tipo de procedimento. Enquanto a
supervisora aguardava pela cirurgia na rede pública, a chefia mudou suas
funções, designando-a para a fiscalização de terceiros, tarefa
conhecida na empresa como "geladeira". A nova chefe, segundo a
funcionária, também fazia comentários depreciativos e a ameaçava de
demissão, o que acabou acontecendo em 2008, com sua exclusão do plano de
saúde.
Na
reclamação trabalhista, a empregada assinalou que a obesidade mórbida é
uma doença crônica, e não "relaxo", como era taxada pela empresa – que,
por sua vez, não autorizou a cirurgia. Entre outras verbas, pediu
reparação por dano moral no valor de cem vezes seu último salário, pelas
humilhações sofridas no trabalho, e ainda indenização pelos danos
morais e materiais sofridos por ela e pela família com a "exclusão
sumária" do plano de saúde.
Abusos
As
testemunhas ouvidas pelo juízo da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo
confirmaram os abusos de autoridade praticados pelos superiores
hierárquicos. A sentença deferiu reparação no valor de R$ 30 mil, mas
indeferiu o pedido relativo ao plano de saúde. "Cessado o contrato de
trabalho, a empresa não é obrigada à manutenção do plano de saúde,
exceto se o empregado demonstrar interesse em mantê-lo, arcando com a
integralidade do valor, o que não foi o caso".
A
sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região,
com o fundamento de que a discriminação não ficou demonstrada. "É certo
que seu superior hierárquico não era um padrão de elegância e
gentileza, mas extrair da afirmação de que o uniforme não lhe servia por
causa de seu peso não constitui ofensa passível de indenização",
afirmou o Regional, que ainda negou seguimento do recurso de revista ao
TST.
Princípios fundamentais
No
exame do caso pela Terceira Turma, o relator, ministro Maurício Godinho
Delgado, deu provimento ao agravo de instrumento e julgou o recurso de
revista, dando-lhe provimento. "O princípio da não discriminação é
princípio de proteção, de resistência, denegatório de conduta que se
considera mínimo para a convivência entre as pessoas", afirmou em seu
voto.
O
ministro observou que as proteções jurídicas contra discriminações na
relação de emprego são distintas. Além daquelas com repercussão
salarial, há ainda proteções contra discriminações em geral, que
envolvem tipos diversos e variados de empregados ou tipos de situações
contratuais.
No
caso da ex-supervisora, Maurício Godinho assinalou que o próprio TRT
registrou que ela era alvo contumaz de piadas e chacotas de seu chefe,
inclusive na presença de clientes e colegas, devido à obesidade mórbida.
Essa prática, como destacou, "se contrapõe aos princípios basilares da
nova ordem constitucional", especialmente aqueles que dizem respeito à
proteção da dignidade humana e da valorização do trabalho (artigo 1º,
incisos III e IV, da Constituição da República) e à isonomia de tratamento (artigo 5º, caput).
Com
este fundamento, concluiu ser "forçoso" restabelecer a sentença. Quanto
ao valor da indenização, porém, levou em conta os valores fixados no
TST, analisados caso a caso, e julgou devida sua readequação, fixando-o
em R$ 10 mil.
FONTE: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=visualiza_noticia&id_caderno=&id_noticia=91383
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