José Carlos de Almeida - Projeto Criança em Movimento Obesidade Infantil em Maracaju: Obeso é uma “four-letter word”

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Obeso é uma “four-letter word”

Tem a palavra obeso uma conotação que vai para além do seu significado técnico? Obviamente que sim. E isso deve fazer-nos parar e pensar antes de a usarmos em frases como “os obesos são geralmente bem dispostos”. A propósito, trata-se de um falso estereótipo, mas já lá vamos...
Como é sabido, “four-letter word” é uma expressão usada em língua inglesa para indicar palavras obscenas, “malditas” ou pejorativas. Porque razão estaria obeso nesta categoria? Não é desejável usar o termo tecnicamente mais adequado para uma dada condição? Se a condição é obesidade, então a pessoa pode e deve ser descrita como obesa. Ou não?
Desde já, como chamamos a alguém que sofre de cancro (é curioso que nunca usamos a expressão "sofrer de obesidade"...)? Ou tuberculose? Ou cirrose hepática? Para responder melhor, consideremos estudos em que foi pedido a participantes para associarem imagens de pessoas de vários tamanhos a características positivas (ex. inteligente) ou negativas (ex. desleixado). Os resultados foram claros: As pessoas com mais peso foram invariavelmente classificadas de forma mais negativa, tal como “preguiçosas”, “sem auto-disciplina”, “desleixadas”, ou até (pasme-se!) “com menos higiene”, “pouco inteligentes” e “desonestas”!
Sabemos também que os falsos estereótipos associados à obesidade se manifestam até em crianças muito novas, que atribuem aos seus colegas mais gordinhos o que de pior já aprenderam sobre as pessoas. E que provavelmente estabeleceram esta associação através de imagens em filmes, televisão ou publicidade. Para quando uma notícia sobre obesidade ilustrada com imagens de pessoas grandes mas bonitas, bem sucedidas ou até (imagine-se) a ingerir alimentos saudáveis? Elas existem.
É também notável o facto de mesmo entre as pessoas com obesidade estes preconceitos se manifestarem. Ao contrário de outros grupos discriminados, que se auto-protegem e recusam a discriminação, neste caso as próprias vítimas de discriminação interiorizaram a norma social que as penaliza. Vivem assim com o triplo “peso” do seu peso: limitações pessoais (por exemplo, na sua mobilidade), discriminação social, e a insatisfação resultante da culpa de ter obesidade, que atribuem a si próprios.
A respeito de culpa e atribuição de responsabilidade pelo peso, importa recordar o que diz a Sociedade Norte-americana de Obesidade*: “A obesidade é uma condição complexa e com muitas influências causais, incluindo factores genéticos e ambientais que estão em grande medida além do controlo e da possibilidade de escolha do indivíduo”. Exagerando, já se imaginou a passear na rua e pensar que pelo facto de aparentar já alguma calvice, as pessoas o consideram desleixado? Exagerando menos, fique também a saber que (e cito) “as pessoas com obesidade demoram mais a ser atendidas ao balcão, têm mais dificuldade em alugar uma casa, são preteridas nas ofertas de emprego mesmo apresentando qualificações similares... e são menosprezadas por professores e por profissionais de saúde”*. Estes são factos comprovados. E não são aceitáveis. Mas são quase sempre ignorados nas discussões sobre obesidade.
Se mais nenhum argumento existisse, sabemos hoje de fonte segura que as pessoas que sofrem de obesidade preferem outras expressões – para além de obeso – para descrever a sua condição. Mesmo quando usadas por profissionais de saúde. 
FONTE: http://lifestyle.publico.pt/pesomedida/303223_obeso-e-uma-four-letter-word

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