Uma notícia polêmica da BBC
me deixou desconcertado. Relatório do parlamento inglês propõe que
palavras como “obesidade”, “excesso de peso” e outros nomes que indiquem
aparência alternativa sejam eliminadas do vocabulário de profissionais
de saúde, professores e da sociedade em geral. Mais intrigante ainda é o
fato de a proposta ter vindo da Inglaterra, um dos países mais afetados
pela doença (cujas previsões são alarmantes).
A primeira vista, minha impressão não foi nada boa dessa proposta.
Mas gostaria de ver outras óticas nos comentários. Entre os
manifestantes favoráveis à medida, dois argumentos sérios vêm ganhando
força. Vou discutí-los separamente, tentando argumentar a insuficiência
destes. Primeiro, argumentam que existe uma banalização
dos termos pejorativos ligados ao excesso de peso. Ok, é verdade. Hoje
mesmo tivemos um caso infeliz nos jornais: Fausto Silva solta a palavra “bucho” e se dá mal.
Deixando de lado ofensas de mau gosto, será que o mais sensato seria mesmo eliminar todos os termos ligados ao sobrepeso?
Minha resposta é não. Independente de ser ou não um juízo de valor, a
obesidade é uma medida clínica. Em ocasiões importantes a objetividade
no diagnóstico é essencial. O médico precisa ter parâmetros para
informar os riscos que seu paciente está incorrendo ao escolher um
estilo de vida. Em trabalhos acadêmicos também é necessário saber os
limiares exatos que caracterizam o excesso de peso.
O segundo argumento sério que vem sendo usado pelos
que querem extirpar a “fat family” do dicionário é o fato de que: não há
um medidor perfeito para a gordura corporal. Esse é um ponto muito
discutido nas pesquisas empíricas. Volta e meia usa-se um valor de IMC
acima de 30 para caracterizar a obesidade. Apesar de ser muito usado por
ser fácil de ser calculado, o IMC é cada vez mais conhecido como um
substituto imperfeito da gordura corporal. Para se ter uma ideia, uma pesquisa (pdf) estimou que o IMC sozinho explica só 26% das variações da gordura corporal.
O gráfico abaixo da pesquisa de Romero-Corral
ilustra esse problema. Veja como o IMC (a sigla em ingês é BMI) se
ajusta de maneira bastante grosseira à gordura corporal (BF é a sigla em
inglês).
Vou tentar explicar o motivo em poucas palavras. O IMC não faz
distinção entre gordura e massa livre de gordura, tais como os músculos e
ossos, não identificando, por exemplo, pessoas musculosas em excesso de
peso mas com pouca gordura corporal (vide quarto quadrante). Por outro
lado, pessoas com baixo IMC também estão sujeitas a terem alto nível de
adiposidade (vide segundo quadrante). Daí vem toda a cautela que deve-se
tomar ao usar o IMC.
Questões de metodologia à parte, é preciso ter em mente que nada
disso justifica relevar a existência dos problemas que o excesso de peso
acarreta. Estes debates deveriam servir para melhorar os métodos dos
trabalhos e, quem sabe, até trazer soluções; abandonar de uma vez por
todas conceitos ligados à obesidade só vai dificultar o diagnóstico.
É importante que estas medidas continuem sendo estudadas e que a
‘obesidade’ (a palavra) continue existindo! Não vou negar que há também
um interesse pessoal nessa questão. A variável obesidade está presente
em todas as especificações da minha monografia.
Não só a minha pesquisa, mas também uma infinidade de tantas outras,
dependem dessas definições para avaliar os efeitos que a obesidade pode
vir a ter, por exemplo, no salário. E mais, a “Economia da Obesidade”
existe e já é uma área consolidada dentro da economia, será que
pretendem censurá-la também? É um risco. Ao censurar a obesidade, até
mesmo pesquisas que avaliam se determinado grupo sofre ou não algum tipo
de discriminação devido ao peso, também ficarão sem critério.
Resumo da ópera: querem “deletar” o verbete do dicionário. A má notícia é que a obesidade continuará sendo um problema.
FONTE: http://prosaeconomica.com/2012/06/05/obesidade-censurada/
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